Desde a redemocratização após o período
militar, nossa frágil democracia nunca esteve tão ameaçada como agora. Está
sendo corroída por dentro como vítima de um câncer cuja metástase se espalha
por todas as instituições que deveriam protegê-la. Do Congresso Nacional ao Supremo
Tribunal Federal, passando pelo Palácio do Planalto, as forças do
obscurantismo, da corrupção e do crime organizado, que parece mais unido e mais
organizado que antes, avançam sobre a civilidade, os direitos fundamentais, a
organização social, e a democracia propriamente dita.
O surto de civilidade que a Lava
Jato trouxe na forma da lei, que pela primeira vez na história da nação levou
para a cadeia os poderosos do colarinho branco, se vê ameaçada pelo projeto
anticrime aprovado no Congresso, que restringe a ação de juízes, promotores
públicos e polícias, na defesa da lei. Nossas autoridades fazem essas coisas
pensando em suas próprias defesas, como salvaguardas contra acusações e possíveis
condenações de seus próprios crimes, mesmo que com isso ajudem a livrar a cara
de todos os criminosos abonados, que essas coisas não são feitas para livrar o
bandidinho da esquina, apesar dele também ser beneficiado, basta ter dinheiro
pra pagar advogado. Por isso o crime organizado, leia-se narcotráfico e milícias,
estão comemorando com os dentes arreganhados de felicidade. Basta ter dinheiro que
ninguém irá pra cadeia, portanto, ser trabalhador honesto e ganhar uma merreca
por mês fica cada vez mais sem graça.
Sempre fomos considerados uma
república de bananas, já éramos o paraíso da impunidade, mas agora somos de
forma oficial, com leis passadas pelo Congresso, com o beneplácito do STF, do
executivo, e sob os aplausos das organizações criminosas. Tudo isso depois de
um parlamentar gritar na própria Câmara que o crime organizado está elegendo
vereadores, prefeitos, deputados e senadores em todo o pais, para tratar de seus
interesses. Não que já não soubéssemos, basta olhar para a realidade do Rio de
Janeiro. Pelo menos, metade da população do Grande Rio vive numa situação de estado
de sítio, precisa voltar cedo para casa com medo da bandidagem, é obrigada a fazer
as compras nos estabelecimentos indicados pelos bandidos, paga propina para a milícia,
ou para o narcotráfico, se quiser construir ou abrir comércio, convive com
sujeitos armados pelas ruas, e nas eleições é obrigada a votar nos candidatos apontados
pelos criminosos. É obrigada a tudo isso, e não consegue se livrar das balas
perdidas, dos hospitais superlotados sem as mínimas condições de atendimento,
dos transportes irregulares e de tantas outras mazelas.
Cada vez mais estamos sucumbindo num
país de desigualdades, com pessoas com muitos direitos e outras sem direito
nenhum. Na próxima semana o STF decide se os condenados da Lava Jato, mesmo com
todo o estrago que nos fizeram, podem ter suas condenações suspensas, voltarem
para casa e, certamente, continuarem com seus crimes. É um escárnio com a
nação. Nossa democracia agoniza.
Comentários
Postar um comentário