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A PESTE DA PESTE

A leitura do romance A Peste, de Albert Camus, lançado em 1947, traz exemplos e ensinamentos significativos para nós. O livro é uma dessas obras que não envelhecem, nem saem de cena, e tornou-se mais urgente neste momento de pandemia que estamos vivendo, e não é por acaso. 

A história começa numa manhã de abril dos anos de 1940, o doutor Bernard Rieux sai do seu consultório e tropeça num rato morto. Este é o primeiro sinal do que vem a ser a epidemia de peste que em breve tomará conta da cidade de Orã, na Argélia. Forçada a quarentena, a cidade se torna um território irrespirável e os seus habitantes passam a viver momentos de muito sofrimento e loucura, mas também de muita compaixão. Uma história arrebatadora sobre o horror, a sobrevivência e a resiliência do ser humano. A população reage, indo da apatia à ação, e alguns, como o protagonista, se expõem ao risco para enfrentar a disseminação da doença.

Mas há os aproveitadores, como o personagem que lucra com um mercado paralelo de produtos. Num primeiro momento, as autoridades minimizam a situação, tentam negar ou esconder, como se fosse possível.

Esse é um ponto da obra bastante peculiar à realidade que temos hoje no Brasil, onde a desinformação tem sido moeda corrente, e o negacionismo, o boicote as vacinas e as atividades de prevenção levaram milhares de brasileiros à morte, sem contar as sequelas que milhões de outros estão vivendo. Em A Peste o autor mostra como as coisas acontecem, como essas coisas são moldadas, através da desinformação, da histeria, de comportamentos levianos ou xenofóbicos, como temos visto por aqui.

Outra coincidência é a questão da burocratização das informações sobre as mortes, que pode gerar certa desumanização dos casos. No livro, o número de mortes é anunciado diariamente numa rádio, mas o narrador descreve algumas delas, para que o leitor possa percebê-las cruamente.

Uma lição importante a se tirar do livro, e trazer para vida, é que em A Peste, de Camus, assim como na pandemia que estamos vivendo, ninguém vai se salvar sozinho, que a solução passa pelo coletivo. Neste momento em que temos tantas divisões no Brasil, em que se desrespeita não só as normas de prevenção, e se promove o esgarçamento social, fica a sugestão na ficção de Camus para que se pense o país nessa pandemia como um organismo único. O que atravessarmos, vamos atravessar juntos, a peste-covid-19 é assunto de todos.

Trazendo ainda para nosso caso, até que ponto pode ir pessoas que boicotam a aquisição de produtos,  ou vacinas, para poder de outro lado conseguir propina através de compra superfaturada, como temos visto no desenrolar da CPI, no Senado.    

Assim como compreender a motivação que leva o protagonista, Dr. Rieux, a deixar de lado seus problemas pessoais, seus sonhos e sua carreira para socorrer os moribundos? Esse embate entre a perda dos sonhos ou, então, sua suspensão temporária, e o isolamento social e cultural, são o cenário que experimentamos na vida real em tempos de Covid-19.

A peste será um dos livros a ser resenhado na volta de nosso podcast em agosto.

 

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